Encruzilhada decisiva para a ciência em um mundo em crise

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Em um mundo atravessado por crises interligadas — climáticas, geopolíticas e tecnológicas —, a ciência vive uma encruzilhada decisiva: continuará a se apoiar na cooperação internacional ou cederá espaço para o avanço de ideologias que propagam o negacionismo científico, o ataque às universidades e uma lógica de funcionamento cada vez mais excludente? Pressões políticas e econômicas têm empurrado muitos países do Norte Global que ainda estimulam a ciência a adotar lógicas de segregação, restringindo colaborações, impondo barreiras ao intercâmbio de pesquisadores e dificultando o acesso de imigrantes às universidades. Ao mesmo tempo, cresce a expectativa de que instituições acadêmicas liderem respostas éticas, inclusivas e sustentáveis para desafios comuns à humanidade.

No Sul Global, que já desempenha um papel significativo na produção científica mundial (em 2024, por exemplo, 60% dos artigos publicados globalmente incluem autores de países de baixa e média renda), essa prática é uma realidade em muitas frentes. Reconhecer essas experiências será fundamental para que a ciência e o ensino superior avancem em um ritmo coerente com os desafios do presente.

Ainda assim, grande parte dos talentos que seriam provenientes dos países em desenvolvimento enfrentam barreiras estruturais, que afetam desde o acesso à educação básica até a permanência na carreira científica para aqueles que conseguem alcançar o ensino superior.

Olhar para essa iniquidade deve ser uma tarefa global, por alguns motivos: primeiro, o planeta vive um momento de mudança demográfica importante. Até 2050, as projeções indicam que o continente africano será responsável por quase 40% da população jovem do planeta, enquanto os países do Norte Global enfrentam desafios relacionados ao envelhecimento da população e à queda de matrículas no ensino superior, como destacado em artigo publicado na revista International Higher Education.

Além disso, muitos dos grandes desafios do mundo estão profundamente enraizados nos contextos do Sul Global, como a preservação ambiental. E quem melhor do que os pesquisadores locais, com conhecimento direto da realidade, para aprofundar essas questões e construir soluções mais eficazes e contextualizadas?

Em um artigo de opinião recente publicado na revista Nature, o físico e atual diretor executivo da Academia Mundial de Ciências da Unesco, Marcelo Knobel, traz um ponto central para o debate: a chave para a mudança está na disponibilidade de oportunidades. Isso, no entanto, exige um esforço global coordenado, envolvendo a sociedade, os governos, os financiadores da ciência e os próprios cientistas.

Em meio às tensões globais marcadas pela escalada de guerras e pela intolerância, a ciência pode representar um valioso ponto de convergência para a humanidade, baseada em linguagem comum e compromissos compartilhados. Para cumprir esse papel no fortalecimento da solidariedade global, no entanto, a ciência precisa ser verdadeiramente inclusiva. Isso significa reconhecer que oferecer oportunidades a cientistas do Sul Global não é um gesto de caridade, como destaca Knobel, mas uma escolha estratégica com impactos concretos para o futuro do planeta

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