Entenda o que é a síndrome da fadiga crônica, doença que causa cansaço extremo

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Cansaço extremo para a realização de qualquer atividade física, sudorese e dificuldade para raciocinar foram alguns dos sintomas vivenciados por Ivana Andrade, 35, durante quase 20 anos, até ela descobrir que era portadora da SFC (síndrome da fadiga crônica), também conhecida como encefalomielite miálgica.

O problema é multissistêmico e afeta diversas partes do corpo, o que dificulta o diagnóstico e confunde a condição com outras doenças, como as psicológicas. "Vivenciei um gaslighting médico porque o meu diagnóstico foi extremamente difícil. Por anos me convenceram de que eu tinha ansiedade, depressão e até preguiça", diz Ivana, que é psicóloga e estuda a encefalomielite miálgica no mestrado.

Sem exame específico para detectar a condição, a síndrome da fadiga crônica costuma ser diagnosticada de forma clínica. Médico e professor associado da Universidade de Londres e da Universidade da Colúmbia Britânica, no Canadá, Luis Nacul é pesquisador da encefalomielite miálgica e foi um dos especialistas que ajudou Ivana a descobrir o que tinha.

De acordo com ele, a doença é debilitante e pode afetar atividades rotineiras dos pacientes. "Existem pessoas com formas mais leves da doença que ainda conseguem trabalhar, mas muitos só conseguem exercer a atividade por algumas horas e em período parcial, principalmente por causa dos sintomas. Uma grande quantidade de pacientes acaba tendo uma incapacidade laboral", acrescenta.

Embora não existam, segundo os especialistas, estudos que associem uma maior prevalência da síndrome da fadiga crônica às mulheres, os números apontam que elas são as mais afetadas pela condição, ao menos no Brasil. De acordo com o Ministério da Saúde, dados do Siaps (Sistema de Informação para a Atenção Primária à Saúde) apontam que em 2024 foram registrados 591.389 atendimentos relacionados à fadiga crônica na atenção primária, dos quais 65,7% eram mulheres.

A crise mais forte de Ivana ocorreu em 2014, quando ela precisou abandonar seu então emprego como fotógrafa e o curso de direito. Na ocasião, chegou a ficar quatro meses de cama devido à intensidade dos sintomas, como aumento da frequência cardíaca só de ficar em pé, sudorese e náusea. Além do impacto na vida profissional, a síndrome causou prejuízos em sua vida afetiva e ela diz ter dificuldades para sair e conhecer novas pessoas por causa das limitações.

No trabalho, Ivana diz que consegue aguentar uma rotina de no máximo 20 horas semanais. Atualmente, só consegue realizar as atividades do mestrado, para o qual recebe uma bolsa. Vivendo sozinha em São Paulo, ela conta que depende de marmita ou delivery porque ficar em pé (e também sentada) por tempo prolongado lhe causa intenso mal-estar.

A síndrome tem como principal sintoma a própria fadiga, especialmente após a realização de esforço físico, além de sono não reparador, ou seja, de qualidade ruim. Outros sintomas são depressão cognitiva, disautonomia (tontura ao ficar em pé) e aumento da frequência cardíaca

"Já tentei medicina ayurvédica, massagem, acupuntura, mas as intervenções que funcionaram foram as medicações para os sintomas", diz Ivana. Com alterações cardíacas e interferência na pressão, ela diz que o tratamento envolve uso de betabloqueadores, por exemplo.

Médico e membro da comissão científica de doenças raras da SBR (Sociedade Brasileira de Reumatologia), Nilton Salles afirma que a síndome da fadiga crônica não tem cura e pode ter gatilho infeccioso associado à predisposição genética. Um dos exemplos citados por ele são os casos de SFC desenvolvidos após a Covid longa. "Nesse caso o gatilho é o vírus Sars-Cov, mas essa manifestação é semelhante em casos pós-influenza, mononucleose, parvovirose… existem vários vírus que podem provocar esse gatilho para o sistema imunológico."

O tratamento, segundo ele, é pensado para manter o paciente ativo. "Mas em alguns casos a indicação de atividade física pode piorar as queixas. Então não existe uma alternativa que resolva o problema e essa doença requer um acompanhamento multidisciplinar", diz.

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Professor assistente na Escola de Medicina de Harvard e um dos principais pesquisadores em síndrome da fadiga crônica, David Systrom diz ainda que a indicação de atividade física para pacientes da SFC é um assunto controverso. "É um ponto complicado, por causa do mal-estar pós-esforço. Então nossa abordagem tem sido tratar com medicamento primeiro, para o paciente melhorar, e depois avançar gradualmente, com exercícios."

De acordo com o Ministério da Saúde, o manejo clínico da síndrome da fadiga crônica no SUS (Sistema Único de Saúde) segue o PCDT (Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas) de dor crônica, nas situações em que a dor crônica está presente, e o tratamento é baseado no controle dos sintomas.

"O cuidado aos indivíduos com fadiga crônica deve ser multidisciplinar, envolvendo uma combinação de tratamentos farmacológicos (analgésicos, antidepressivos e medicamentos para distúrbios do sono) e não farmacológicos (podem incluir fisioterapia, atividade física supervisionada e apoio psicossocial)", disse a pasta, em nota enviada à reportagem.

Ativista pela conscientização sobre a doença, Ivana diz ter entrado com uma ação no MPF (Ministério Público Federal) no último ano para questionar a lei 14.705/2023 (que estabelece diretrizes para o atendimento a pacientes com SFC e outras doenças correlatas) e a ausência de diretrizes específicas para o tratamento da condição no SUS. "Eu ressaltei na ação a importância de ter profissionais da saúde que estejam estudando, pesquisando e atendendo esses pacientes."

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