As mariposas Bogong (Agrotis infusa), naturais da Austrália, são a primeira espécie de invertebrados conhecida a navegar longas distâncias migratórias tendo o céu como guia. A afirmação é feita por pesquisadores em um estudo publicado nesta quarta-feira (18) na revista Nature.
O trabalho foi liderado pelo professor de entomologia Eric Warrant, da Universidade de Lund, na Suécia. Ele e sua equipe descobriram que neurônios visuais de diferentes regiões dos cérebros desses insetos respondem a orientações e a rotações do céu noturno. Para chegar a essa conclusão, o grupo fez experimentos em um laboratório na cidade australiana de Adaminaby.
Warrant, que estuda a combinação entre física e entomologia (área do conhecimento que estuda insetos), coordena o Grupo de Visão da universidade. O laboratório desenvolve pesquisas sobre visão e comportamento de vários animais, como insetos e crustáceos. Entre as especialidades do grupo, estão os estudos que relacionam visão e navegação.
Pode gerar confusão, mas, no contexto deste trabalho, o termo navegação não está associado a barcos. Na realidade, ele consiste em uma maneira científica de dizer que os insetos se guiam por pistas visuais e olfativas, por exemplo, no momento de se deslocar.
Já se sabia que o percurso percorrido por insetos era influenciado por informações genéticas que guardam direções migratórias, pelo campo magnético da Terra e por pontos de referência visuais. Esses pontos de referência naturais ainda não eram claros, mas os cientistas sabiam que constelações de estrelas, luz polarizada da Lua e a própria Via Láctea eram bons candidatos.
Para testar essas hipóteses, eles decidiram avaliar as mariposas Bogong, que migram para cavernas nos Alpes australianos durante a primavera. Esse deslocamento permite que elas fujam do calor do verão. No início do outono, com a diminuição das temperaturas, retornam para os locais onde nasceram.
Os pesquisadores capturaram alguns desses insetos que estavam no processo migratório. Os animais foram, então, levados para dois simuladores de voo adaptados.
O simulador inicial expôs as mariposas ao campo magnético da Terra. Nele, elas tinham uma visão completa das paisagens naturais que as rodeavam. O segundo simulador, por sua vez, estava submetido a um sistema que anulava o campo magnético e que projetava o céu noturno.
O ponto de partida da análise comportamental era: se as mariposas Bogong realmente se guiam por meio do posicionamento de corpos celestes, elas precisam lidar com as mudanças de posição dos astros por estação e com o movimento deles ao longo da noite.
Após a observação do comportamento das mariposas no primeiro simulador, os pesquisadores notaram que elas se orientavam na direção esperada para a migração e, também, mantinham o mesmo sentido apesar dos movimentos do céu noturno. Viram ainda que elas não se perdiam caso o céu fosse obscurecido por nuvens, pois se guiavam pelo campo magnético da Terra.
No segundo simulador, sem influência de campo magnético e no qual o céu era apenas uma projeção, as mariposas conseguiam navegar mesmo que o sentido do céu fosse alterado em 180°. Porém, quando os cientistas mudaram aleatoriamente a disposição das estrelas, elas ficaram desorientadas.
Os resultados indicam que as Bogong podem usar tanto o céu estrelado quanto o campo magnético, individualmente, como bússolas de navegação para diferenciar direções. Fora de um sistema laboratorial, esses elementos são usados em conjunto. Na ausência de ambos, elas se desorientam.
Ainda segundo a pesquisa, os neurônios das mariposas foram estimulados pelos mesmos fatores presentes no segundo simulador de voo (ausência de campo magnético e céu estrelado). Mas nem todas as células nervosas responderam igualmente aos estímulos.
Além disso, os neurônios não servem apenas para detectar movimentos, mas também estão sintonizados a elementos do céu noturno, como o formato da Via Láctea e sua região mais brilhante.
Os dados do estudo referente aos neurônios demonstram ainda que, além dos aspectos comportamentais (compasso dependente das estrelas e do campo magnético terrestre), o próprio cérebro desses animais têm informações sobre o céu noturno decodificadas.
Agora, os pesquisadores esperam identificar quais elementos específicos do céu estrelado são importantes para a navegação dessas mariposas ou quais propriedades dos neurônios variam conforme o estado comportamental delas.