Mortes: Ganhou o mundo com o tambor que herdou do seu axé

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Acompanhando o avô, José Roberto Brandão Telles frequentou o candomblé desde pequeno. Foi nos terreiros que o menino, nascido e criado no distrito Coelho da Rocha, em São João de Meriti (RJ), aprendeu a tocar percussão. Fez o santo cedo e foi confirmado ogã na juventude. A relação com o tambor se tornou cada vez mais íntima —quase uma extensão do seu corpo— e virou profissão.

O nome artístico escolhido foi um casamento de apelidos, uniu o Zé de José e Rô de Roberto. Zero Telles ficou conhecido como um dos maiores percussionistas da música brasileira.

"Ele tinha um talento único, tinha um suingue quando tocava. Foi a música que fez ele ter as primeiras conquistas. Ele saiu de Coelho da Rocha para o mundo, graças ao tambor", diz a mulher, Herika Cunha, 45.

Zero colaborou com muitos artistas, incluindo Ney Matogrosso, Martinho da Vila e João Bosco. Chegou a fazer parte da banda Blitz, tocou no Monobloco e, nos últimos anos, integrou a Orquestra Imperial, big band carioca da qual era membro fundador.

Pisou em palcos país adentro e afora. Quando Maria Bethânia foi a homenageada do Prêmio da Música Brasileira, em 2015, ele esteve no Theatro Municipal do Rio de Janeiro como parte da banda do show especial.

Em uma viagem para um festival em Havana (Cuba), aprendeu a tocar o xequerê, instrumento africano feito com cabaça e miçangas. Foi ele o grande responsável por introduzi-lo no Brasil, inclusive nas escolas de samba. Zero integrou o time de ritmistas da Unidos de Vila Isabel e vinha sempre à frente da bateria chacoalhando seu xequerê.

Seu som está registrado no single "Elegua Awá", lançado em 2020. Awá também se tornou seu sobrenome artístico nos últimos anos, uma palavra que vem da religião de matriz africana ifá cubano.

Sua iniciação nessa religião foi no início dos anos 2000 e se tornou um sacerdote no Rio, um babalawo de ifá. Mantinha uma casa espiritual em Vila Isabel com muitos afilhados, alguns inclusive do meio da música.

Apesar de dominar apresentações, fora dos holofotes era uma pessoa muito reservada. Gostava de conversar sobre música, política e futebol. Tinha o Fluminense como clube do coração e era um lulista ferrenho, inclusive tocou na terceira posse do presidente.

Zero Awá morreu no dia 28 de maio, aos 68 anos, por causa de complicações de uma cirurgia no fígado. Deixa a mulher, Herika, 45, e o filho José Francisco, 16.

coluna.obituario@grupofolha.com.br

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