O impacto do vazio regulatório sobre o streaming no Brasil

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O Brasil é o segundo mercado mundial de streaming. São cerca de 60 plataformas que, somadas, oferecem mais de 90 mil títulos. Desse total, apenas cerca de 4.700 obras foram produzidas no Brasil; e em dez dessas plataformas não há uma só produção nacional.

A falta de regulação traz um aspecto perverso, que é a não obrigatoriedade da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional, a Condecine (imposta às empresas brasileiras de telecomunicação e TVs e principal financiadora do Fundo Setorial do Audiovisual).

Significa que as companhias internacionais, como Netflix e Amazon, faturam milhões no país (segundo o Cade, o valor em 2023 foi de US$ 1,95 bilhão), mas suas receitas não contribuem para o reinvestimento no setor.

É urgente também que as plataformas garantam os direitos patrimoniais e de propriedade intelectual às produtoras brasileiras responsáveis pelas realizações. Mais de 40 associações (como Apaci, Abraci e Sindcine) são unânimes em defender uma política pública que ocupe o atual vazio regulatório e proteja a soberania nacional.


Outros pontos pleiteados são a alíquota mínima de 12% sobre o faturamento bruto das companhias; cota mínima de 20% de conteúdo brasileiro; descontos para catálogos e benefícios apenas para obras brasileiras independentes; garantia de que até 30% dos recursos sejam para investimento direto e 70% para políticas públicas, via Fundo Setorial.

Diversos países regularam seus mercados, como EUA, Canadá e Índia. A União Europeia determinou em 2018 que 30% do conteúdo veiculado por streaming fosse produzido localmente. A França impôs investimento de 25% da renda obtida pelas plataformas em projetos locais.

A legislação precisa acompanhar as alterações nos formatos e modos de produção advindas das novas tecnologias.

Em 2011, passou a valer no Brasil a "lei da TV paga" (12.485), cujo objetivo não era diferente do que se defende hoje: a garantia de conteúdo nacional nas grades dos canais. A legislação foi acertada e impulsionou fortemente o setor.

Além do fomento, a Agência Nacional do Cinema também é responsável pela regulação e fiscalização do mercado. Sua atuação é imprescindível para que um arcabouço jurídico e legislativo se imponha, com vistas a um equilibrado desenvolvimento do setor, que gera 126 mil empregos diretos e 657 mil indiretos (segundo a Oxford Economics).

Nesse limbo, há dois projetos em tramitação: o PL 8.889/2017 (de Paulo Teixeira, com relatoria de André Figueiredo) e o PL 2.331/2022 (de Eduardo Gomes, com relatoria de Jandira Feghali).

O segundo foi aprovado pelo Senado e caminhou mais rapidamente, mesmo não contemplando integralmente as necessidades do setor. Em abril, Feghali propôs um substitutivo que altera a alíquota sobre o faturamento: de 3% sobre o líquido para 6% sobre o bruto. Ainda que a alteração represente um ganho sobre o PL, é insuficiente e não faz jus à potência da indústria criativa brasileira.

A defesa é para que o setor, ainda fortemente impactado pelos efeitos nefastos da última gestão presidencial, associados à pandemia da Covid-19, continue gerando emprego e renda, contribuindo para o PIB e levando o Brasil a se ver nas telas, por todos os meios e formatos.

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