Para chegar ao topo de Cerro Pachón, uma montanha no Atacama, Chile, os astrônomos fazem uma viagem de duas horas por uma estrada sinuosa e acidentada. A vegetação exuberante na base da montanha dá lugar lentamente aos tons marrons e amarelos do deserto. No fim, os telescópios surgem à distância, com o sol refletindo em suas cúpulas metálicas.
Entre eles está o mais novo olho para o Cosmos: o Observatório Vera C. Rubin, que abriga a maior câmera digital já construída. Durante os próximos dez anos, o telescópio aproveitará sua posição sob os céus chilenos, um dos mais escuros da Terra, para realizar um levantamento astronômico mais ambicioso do que qualquer instrumento científico que o antecedeu.
Com base nesse levantamento, os astrônomos esperam aprender sobre o nascimento da nossa galáxia, a Via Láctea, sobre a misteriosa matéria que compõe grande parte do Cosmos e sobre como o Universo evoluiu para sua configuração atual. Talvez eles até descubram pistas sobre seu destino.
Também usarão o telescópio para localizar milhões de objetos transitórios, "coisas tênues que explodem ou se movem à noite", de acordo com o astrofísico Tony Tyson, da Universidade da Califórnia, em Davis, Estados Unidos. Isso inclui buracos negros e colisões de estrelas densas e mortas.
Mas as descobertas mais valiosas, dizem os astrônomos, estão além dos limites de sua imaginação.
"O Universo sempre nos surpreende", afirmou o astrofísico Michael Strauss, da Universidade de Princeton. Com o Rubin, segundo ele, "ainda não sabemos quais serão essas surpresas".
Apesar de tudo o que a humanidade aprendeu sobre o Universo, a grande maioria deste plano cósmico em que existimos permanece na escuridão.
A melhor teoria até agora descreve um Universo no qual as galáxias, as estrelas, os planetas e todos nós constituímos apenas 5% de toda a matéria e energia existente. Os outros 95% são matéria escura, uma substância invisível que mantém tudo unido, e energia escura, uma força desconhecida que está despedaçando o Universo.
Vera C. Rubin, a astrônoma que dá nome ao observatório, descobriu na década de 1970 evidências da matéria escura. Ao estudar o movimento giratório das galáxias, impulsionado pela gravidade da massa contida nelas, ela deduziu a existência de um tipo de matéria que não podia ser diretamente observada pelos telescópios, porque não emitia, refletia ou absorvia qualquer luz.
Nas décadas seguintes, físicos teóricos desenvolveram inúmeras ideias sobre a composição dessa matéria, a chamada matéria escura. Físicos experimentais construíram detectores cada vez maiores na tentativa de observá-la diretamente, até agora sem sucesso. Mas, durante todo esse tempo, astrônomos passaram a dispor de telescópios cada vez mais potentes que medem como a matéria escura influencia a estrutura e o movimento do Universo que pode ser visto.
A energia escura foi uma descoberta mais recente. Na década de 1990, dois grupos independentes de astrônomos tentaram medir a taxa na qual o Universo estava se expandindo. Ambos os grupos descobriram, no entanto, que em vez de desacelerar como esperado, a expansão do Universo estava acelerando.
O termo energia escura foi criado para descrever a força subjacente que impulsiona essa expansão acelerada. Mas o que ela realmente é e a física por trás de como funciona permanecem um mistério.
Por décadas, astrônomos têm vasculhado o céu noturno para medir os efeitos da matéria escura e da energia escura no que observam no Cosmos.
Foi durante uma dessas noites de observação em 1996 que a ideia do Observatório Rubin nasceu.
Tyson estava ajudando astrônomos visitantes no Telescópio Blanco de quatro metros no Chile a registrar o brilho de supernovas explodindo a diferentes distâncias da Terra. Essas medições ajudaram a calcular a taxa de expansão do Universo, o que levou a um Prêmio Nobel pela descoberta da energia escura em 2011.
O astrofísico lembra que, na época das observações, pensou: "Podemos fazer muito melhor que isso". Ele tinha em mente um telescópio maior, maior cobertura do céu e uma câmera mais potente.
"Tudo parecia possível", afirmou ele.
Os astrônomos se apoderaram dessa ideia e, em 2009, publicaram um documento de quase 600 páginas descrevendo toda a ciência que poderia ser realizada com o que na época era chamado de Grande Telescópio de Levantamento Sinóptico. As propostas variavam desde o estudo das menores galáxias até o rastreamento das maiores estruturas do Cosmos.
A construção do observatório começou seis anos depois. Mais tarde, agências do governo americano anunciaram que o instrumento seria renomeado em homenagem a Rubin.
Rubin vai mapear as profundezas de todo o céu austral à noite pelos próximos dez anos, resultando em um nítido filme em movimento do Cosmos em constante mudança acima de nós.
"Houve muitos levantamentos astronômicos, mas eles não conseguem ser amplos, rápidos e profundos ao mesmo tempo", disse Tyson. Rubin marca o início de uma nova era astronômica, acrescentou ele, "algo que nunca foi feito antes".
O observatório, agora totalmente construído e em condições de funcionamento, está no limiar de seu potencial astronômico. Em abril, ele capturou seu primeiro fóton e, para esta segunda-feira (23), está prevista a divulgação de imagens deslumbrantes mostrando sua perspectiva do Universo. Embora ainda estejam sendo resolvidos problemas operacionais, espera-se que o telescópio inicie seu levantamento científico ainda neste ano.
A cada 30 segundos, o observatório apontará para uma parte diferente do céu, capturando uma área maior que 40 luas cheias. O resultado final será um catálogo de 20 bilhões de galáxias e 20 bilhões de estrelas em seis cores diferentes, estendendo-se não apenas pela vasta extensão do espaço, mas também do tempo.
E, embora o Rubin seja uma iniciativa financiada pelos EUA, os astrônomos afirmam que pessoas em todo o mundo se beneficiarão com o que o observatório descobrirá.
"Estamos fazendo isso para toda a humanidade", afirmou a astrofísica Hiranya Peiris, da Universidade de Cambridge, no Reino Unido. "É assim que entendemos nosso lugar no Universo."