O bairro de Higienópolis, na zona central de São Paulo, foi criado em 1895 pelos comerciantes alemães Martinho Buchard e Victor Nothmann. Tinha esgoto, água encanada, lampiões a gás e linha de bonde. Foi a primeira região com saneamento básico da cidade, era arborizada e logo atraiu ricos cafeicultores que escolheram o lugar para instalar seus palacetes.
Um desses milionários que ficou interessado em morar no bairro foi Carlos Leôncio Magalhães, apelidado de Nhonhô (1875-1931), um dos reis do café. Ele começou a construir sua casa em 1930, tardiamente, na avenida Higienópolis, 758. Queria destacar seu poder e fortuna e contratou o escritório Siciliano e Silva para cuidar do projeto e da construção.
Nhonhô começou a trabalhar cedo com o pai, Carlos Baptista de Magalhães, e, com 16 anos, adquiriu sua primeira fazenda, a Santa Ernestina, em Matão. A propriedade custou quinze contos de réis e nela foram plantados quatrocentos e oitenta mil pés de café. Em pouco tempo, ele adquiriu outras duas fazendas, a Cucuhy e a São Sebastião e somou uma plantação de um milhão e trezentos mil pés de café.
A partir daí, com seus próprios esforços, acumulou terras ininterruptamente que viriam a transformá-lo num dos maiores cafeicultores de São Paulo. A próxima cartada foi a fazenda Cambuhy, em Araraquara, com 500 mil pés de café e duas mil cabeças de gado. Suas propriedades eram tão grandes que eram cruzadas por 70 km de estradas de ferro.
Também fundou a Companhia Industrial, Agrícola e Pastoril, para reunir seus negócios e arrecadar fundos para seus empreendimentos. Chegou a ter 19 fazendas com 300 quilômetros de estradas e dez estações ferroviárias, mas todo seu patrimônio foi adquirido, em 1924, pela Companhia Agrícola Fazendas Paulistas, subsidiária da empresa inglesa Brazilian Warrant. Ficou apenas com uma propriedade, a fazenda Itaquerê, onde plantava café e tinha uma usina de açúcar.
Sua trajetória nababesca é coroada com a construção do palacete, um ano antes de sua morte, aos 56 anos. Em estilo eclético, era um das construções mais grandiosas da região, com 3.500 metros quadrados de área construída, 40 cômodos e cinco andares.
No primeiro andar há uma capela inspirada no Mosteiro dos Jerônimos, de Lisboa, e no subsolo está instalado um anfiteatro com capacidade para 50 pessoas sentadas. Os vitrais são belgas e os mosaicos de vidro Murano.
"Ela mescla vários estilos arquitetônicos e é inspirada nos palacetes franceses do século 19", diz a professora da FAU-USP Giselle Beighelman, que, em 2020, fez o filme "Nhonhô", em parceria com o artista Ilê Sartuzi. "Nos tetos, há entalhes de madeira de lei enfeitados por ogivas de gesso com motivos góticos e lustres de ferro fundido."
Nhonhô nunca chegou a usufruir da casa, que ficou pronta em 1937. Mas sua mulher, Ernestina Reis Magalhães, e cinco dos seus oito filhos moraram no local durante onze anos. No passado, o palacete chegou a ser considerado amaldiçoado. Existe a lenda de que dois filhos do fazendeiro morreram no local, um afogado na banheira e outro enforcado no lustre da sala. A família nega.
Posteriormente, a construção passou para as mãos do governo do estado e, em 1974, se tornou a sede da Secretaria de Segurança Pública e da Delegacia Antissequestro.
A casa pertence hoje ao shopping Pátio Higienópolis, controlado pelo grupo Jereissati. Foi arrematada em 2005 pelo grupo Malzoni num leilão e, posteriormente, restaurada e vendida. Hoje ela se chama Casa Higienópolis e virou um espaço de eventos culturais. Funciona ali também o Paço das Artes. Pela sua importância histórica e arquitetônica, é tombada pelo Condephaat (estadual) e pelo Conpresp (municipal).