Andar em um CLAnf (Carro Lagarta Anfíbio) da Marinha, além de barulhento, é suportar a fumaça preta do diesel queimado, o espaço apertado e, na experiência vivida pela reportagem da Folha, o frio de um dia chuvoso no Rio de Janeiro —intensificado pelos respingos da água esverdeada da baía de Guanabara, que também invadia parte do veículo, considerado inafundável.
"Se ele tombar, ele volta. É a lei do empuxo, é seguro, não tem como afundar", afirmou o cabo Simarlei Stalisnau, um dos operadores, durante instruções a um grupo de jornalistas que andaria pela primeira vez no veículo. Os blindados anfíbios, assim chamados por se locomoverem tanto na água quanto em terra, estão na segurança da reunião do Brics, que ocorre a partir deste domingo (6), de prontidão para o caso de algum atentado.
"Estão empregados seis CLAnfs, atuando diretamente na segurança litorânea e na evacuação pelo mar. O principal uso é, em caso de atentado, evacuar autoridades pela água. Eles também podem transportar outros militares pelo mar", explica o capitão de fragata Carlos Henrique Lussac, comandante do Batalhão de Viaturas Anfíbias.
A localização exata dos veículos não foi divulgada por questões de segurança, mas, segundo o comandante, eles estão distribuídos ao longo do litoral do estado.
O ambiente interno do veículo é apertado, escuro e inviabiliza conversas sem gritos, devido ao alto ruído do motor. A sensação de claustrofobia é imediata, e mais da metade do veículo fica submersa. O piso está sempre molhado, com parte da água cobrindo os sapatos, somada à sujeira da areia da praia ou da lama. A fumaça impregna as paredes internas e as manchas nas roupas são inevitáveis.
"No início deu um medo, porque tenho certa ansiedade em ficar em ambientes confinados, fechados, sem uma luz, digamos assim, no fim do túnel, onde eu possa respirar. Mas não senti isso", relatou o jornalista Cassius Zeilmann.
Para reduzir a sensação de claustrofobia, os militares conduziram o grupo de jornalistas da Ilha das Flores até o navio Bahia com as comportas superiores abertas. "No final, achei tudo muito legal e venci meu medo. Gostei da experiência", acrescentou Cassius.
Os primeiros CLAnfs foram adquiridos pelo Brasil em 1986, dos Estados Unidos, e têm capacidade para transportar 22 militares. O veículo é blindado e pode oferecer apoio de fogo com metralhadoras calibre .50 e lançadores de granadas. Uma guarnição de três militares é necessária para a operação: operador, comandante da viatura e auxiliar.
"Era jogador de vôlei do Flamengo, mas minha paixão sempre foi ser clanfista. Larguei tudo para fazer o curso, era meu sonho. Meu filho tem muito orgulho quando mostro imagens operando ele no mar e em terra", contou o sargento Thiago Ramos, que comandava um dos veículos.
A função principal do CLAnf é garantir o desembarque seguro das tropas em terreno hostil. "Onde o CLAnf teve muito sucesso foi na guerra do Iraque e no Afeganistão. Os militares foram levados até Bagdá em CLAnfs", disse o comandante Lussac.
"Sem o CLAnf, seria como no filme 'O Resgate do Soldado Ryan' [de Steven Spielberg, que mostra o desembarque na Normandia, durante a Segunda Guerra Mundial]. Vários militares desembarcando e morrendo na praia. O CLAnf foi criado justamente para isso: inibir e reduzir a morte de militares no desembarque", completou.
Mas seu uso não se restringe a operações militares. Ele também pode ser empregado em ações de apoio à Defesa Civil, missões de Garantia da Lei e da Ordem, segurança nas eleições e operações humanitárias.
Nas enchentes do Rio Grande do Sul, em 2024, algumas embarcações não conseguiam navegar em razão de obstáculos. Os únicos veículos que conseguiram alcançar populações isoladas foram os CLAnfs, que, além de realizar resgates, também levaram medicamentos e alimentos, explicou Lussac.
As viaturas anfíbias também foram utilizadas no Complexo do Alemão, em 2010, na ocupação das comunidades. Atualmente, a força dispõe de 49 CLAnfs, com autonomia de até 700 quilômetros em terra. As últimas unidades, de terceira geração, foram adquiridas em 2018.