Incêndios ameaçam a biodiversidade até mesmo em florestas que não pegaram fogo

4 days ago 5

Ainda que não atingidas diretamente pelas chamas, algumas florestas estão perdendo espécies. Essa é a principal descoberta de um estudo realizado por cientistas brasileiros no Corredor Cantareira-Mantiqueira, uma importante região de Mata Atlântica, e publicado no periódico científico Forest Ecology and Management.

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A pesquisa mostra que o aumento da "pirodiversidade" —termo que se refere ao mosaico de florestas com diferentes graus de distúrbio causado por incêndios– prejudicou a função de refúgio das áreas não queimadas, resultando em menor riqueza de aves nos fragmentos intactos. O estudo é apoiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

Os pesquisadores analisaram a riqueza de espécies de aves em 15 paisagens com fragmentos florestais na região próxima à cidade de Atibaia, em São Paulo. Com base nos dados do MapBiomas Fogo, foi possível selecioná-las a partir do histórico de incêndios ocorridos desde 1985. A pirodiversidade foi calculada a partir de variações na frequência, extensão, severidade e idade das florestas secundárias, que resultam em formações com diferentes graus de distúrbio.

Foi possível verificar que, quanto maior a diversidade de distúrbios no entorno do fragmento florestal, menor é o número de espécies de aves nas florestas que não foram queimadas. O fogo deixa marcas duradouras, mesmo onde não tocou diretamente.

"Essas áreas deveriam funcionar como refúgios para a fauna após os incêndios, mas descobrimos que essa função está sendo comprometida", explica Ederson José de Godoy, pesquisador do Instituto de Ciências da Natureza da Universidade Federal de Alfenas e primeiro autor do estudo, em comunicado divulgado pela instituição.

A pesquisa também envolveu cientistas do Centro de Ciências e Tecnologias para a Sustentabilidade da Universidade Federal de São Carlos, campus de Sorocaba, e do Laboratório de Ecologia Espacial e Conservação do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista, campus de Rio Claro.

A heterogeneidade do fogo frequentemente decorre de incêndios criminosos e tem impactos profundos e negativos sobre a biodiversidade. Para evitar a perda contínua de espécies, os autores defendem medidas rigorosas de prevenção e ações de restauração ativa nas áreas mais afetadas, aumentando a resiliência das florestas remanescentes.

Além disso, o estudo propõe uma visão crítica à ideia de que a heterogeneidade do fogo possa beneficiar certos ecossistemas, diversificando nichos disponíveis, estabilizando comunidades ecológicas e facilitando a recolonização de espécies após incêndios. "O suporte empírico para a hipótese da pirodiversidade é inconsistente, com estudos confirmando efeitos positivos sobre a biodiversidade em apenas 44% dos casos examinados", afirmam os autores.

"Parece haver um limiar além do qual a pirodiversidade se torna prejudicial. Em tais paisagens, a pirodiversidade excessiva pode levar à simplificação do habitat, afetando negativamente espécies que dependem da vegetação intocada para recursos críticos", escrevem. "Significativamente, 21% da riqueza de espécies, incluindo ameaçadas e endêmicas, foi encontrada exclusivamente em manchas não queimadas, ressaltando a importância crítica dessas áreas para a conservação da biodiversidade", ressaltam os pesquisadores no artigo.

Eles também salientam que os serviços ambientais que as florestas prestam, como polinização, dispersão de sementes, controle climático, controle de pragas e doenças, entre muitos outros, necessariamente requerem florestas intactas e em pleno equilíbrio

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