A cuidadora de crianças Andrea Menezes, 42, estava no trabalho quando recebeu a ligação desesperada de sua filha avisando que sua casa tinha sido invadida durante ação policial que deixou um morto na favela de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, na noite desta quinta-feira (10).
Dois policiais militares foram presos por matarem o homem quando ele já estava rendido, segundo o coronel Emerson Massera, chefe da comunicação da PM paulista, em entrevista coletiva nesta sexta-feira (11). Foi no quarto dela que um jovem foi assassinado.
"Levaram meus edredons e minha coberta com o rapaz enrolado", diz.
Após a morte, a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) divulgou que o imóvel era uma casa-bomba, ou seja, um esconderijo de drogas e armas. Ao lado do corpo, foram encontradas armas e drogas. A moradora afirma que foram colocados ali pelos policiais.
"Minha casa não é bomba. Ninguém mexe com nada de errado aqui. Minha casa não é ponto de droga. É um absurdo", declarou à reportagem. A versão da polícia também foi desmentida pelo coronel na entrevista.
Ao saber que os policiais estavam no portão da casa, impedindo o acesso, Andréa relata que pegou um mototáxi e, ao chegar em dez minutos, também foi proibida de entrar.
O crime teria ocorrido por volta das 15h20, mas ela só pôde entrar em casa à 1h, quando o corpo foi removido pelo IML.
Para ela, antes de ser morto o homem entrou pela janela, mesmo ponto onde teriam entrado os policiais. Um portão da casa estava fechado e foi quebrado. A porta estava destrancada, o que pode ter contribuído para o acesso.
"Eu sempre deixo a casa fechada quando saiu para trabalhar, mas a janela fica aberta para ventilar", conta. Ela mora há dois anos no local.
Uma testemunha contou para a Folha ter visto quando policiais da Rocam (grupo da PM com motocicletas) invadiram a casa. Os agentes usavam capacetes. Na sequência, ela ouviu um tiro. Depois, ouviu gritos de perdi (uma forma de rendição dos suspeitos). Pouco depois, escutou muitos tiros.
A testemunha relatou que não teve tempo de filmar a ação.
Vizinhos disseram que dois dias antes houve uma ação de policiais militares no local também na parte da tarde. Os policiais teriam abordado e ameaçado moradores. Em um dos casos um dos abordados foi jogado no esgoto e recebeu choques.
A região onde ocorreu a morte, próxima de um córrego, é motivo de muitas queixas de moradores pelas abordagens constantes e violentas por parte da PM.
Andréa conta ainda que, após a ação, sumiram os R$ 1.500 em espécie deixados em cima de uma Bíblia. O dinheiro era para pagar o aluguel. "Trabalho o mês todo para conseguir o dinheiro do aluguel, e agora não sei o que vou fazer", diz.
Nesta sexta, o dia foi de limpeza e tapar com massa corrida os buracos deixados pelas balas na casa.
"Não tenho mais coragem de ficar na casa. Ele morreu no meu quarto, como vou dormir aí dentro?"