Morar na natureza não deve ser castigo, diz ICMBio sobre saneamento precário em áreas protegidas

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O dado de que 11,8 milhões de pessoas vivem em unidades de conservação no país, revelado na última sexta-feira (11) pelo Censo 2022, surpreendeu Kátia Torres, diretora de ações socioambientais e consolidação territorial do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Segundo ela, as novas informações serão usadas na gestão das áreas protegidas.

"Grande parte dessas pessoas são trabalhadores da conservação. É importante que os serviços públicos cheguem às comunidades distantes, para que estar dentro da natureza não seja um castigo", afirma à Folha.

O levantamento do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostrou que 40% da população residente em unidades de conservação convive com alguma precariedade de abastecimento de água ou destinação de lixo ou esgoto. É uma taxa superior ao índice nacional, de 27,28%.

Para Torres, a informação é relevante para dar visibilidade às comunidades que vivem em áreas protegidas. "A sociedade precisa enxergar essas pessoas para levar escola, saúde, água, luz e acesso à internet. Essa é uma grande luta da população rural em geral e dos povos tradicionais, que têm uma grande parte da proteção dos seus territórios nas unidades de conservação."

Questionada sobre os impactos da presença humana nos territórios protegidos, em especial nas unidades de proteção integral, que somam 131,5 mil pessoas, Torres afirma que a situação fundiária é complexa e exige análises caso a caso.

"A ocupação irregular pode acontecer em todas as categorias de unidades de conservação. Em todas elas existem pessoas que detêm títulos, com posses legítimas, e os ocupantes irregulares e de má-fé, os grileiros. Identificar quem tem direito legítimo e quem não tem é um trabalho cotidiano na gestão dessas áreas", diz.

O Censo não identifica quantos moradores residem em condição irregular —tampouco o ICMBio dispõe dessa informação. Segundo Torres, a decisão pela chegada ou não de serviços públicos depende de uma análise da situação de cada local.

As unidades de conservação mais populosas são as áreas de proteção ambiental (APAs), que permitem a habitação. Essa categoria somou quase 11,5 milhões de residentes em 2022, equivalente a 97,1% do total de 11,8 milhões.

A diretora do ICMBio destaca que o zoneamento de APAs é um instrumento importante para regularizar a ocupação do solo nessas áreas. O documento define quais usos são permitidos em cada local.

"Nas APAs que estão muito próximas de áreas urbanas ou correspondem a áreas urbanas, o desafio de gestão é grande, com parcelamento de solo, processos de grilagem e pressões diversas de empreendimentos. Mas é essencial que haja a convivência entre proteção da natureza e população humana", diz Torres.

"A realidade é a criação de unidades de conservação em sobreposição a uma diversidade de situações fundiárias, que precisam ser trabalhadas da sua maneira", afirma também.

Nos casos em que é identificada a ocupação irregular, há algumas possibilidades para solucionar o impasse: a desapropriação (reconhecendo o direito a reforma agrária, reassentamento ou indenização), a assinatura de termos de compromisso e o redesenho dos limites da área protegida.

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"Em uma leitura estrita da lei ambiental, temos um cenário, mas é mandatório trabalhar com o conjunto das leis do país e buscar uma harmonização de direitos", defende Torres.

O IBGE também revelou que 21% da população quilombola do país vive em unidades de conservação. O número não causou surpresa, diz a diretora do ICMBio. "A natureza e as pessoas que precisaram se proteger da sociedade dominante se encontram nos mesmos lugares", avalia.

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