Placas de moto com numeração irregular foram flagradas, em média, 185 vezes por dia na cidade de São Paulo em junho deste ano. Ao todo, foram 5.579 registros feitos por câmeras do SmartSampa, programa de monitoramento por vídeo da prefeitura.
Esses equipamentos estariam sendo usados, segundo a gestão Ricardo Nunes (MDB), para driblar a fiscalização e escapar da identificação —no caso de motos usadas em crimes como roubo na cidade.
A numeração desses objetos não consta nos sistemas oficiais. As inscrições mais frequentes são BRA49CC, com 4.743 registros em junho, ou 85% dos casos. Em seguida estão SHI49CC (312), BRC49CC (198) e MOB49CC (169). Essas placas são vendidas por até R$ 20 como peças decorativas em alusão a veículos de até 50 cilindradas, como bicicletas motorizadas e ciclomotores.
Mas usar essas peças como identificação de veículos pode render de quatro a oito anos de prisão e multa, de acordo com o Código Penal. É crime adulterar, remarcar ou suprimir, entre outros itens, a placa de identificação de veículos automotores elétricos, híbridos, entre outros, segundo o texto.
Em junho, ao apresentar um relatório de operação do SmartSampa, Nunes anunciou um pedido ao Ministério dos Transportes para a volta dos lacres metálicos nas placas veiculares. A justificativa, segundo a gestão, é melhorar a fiscalização para combater o uso desses veículos em ações criminosas.
Na época, o prefeito disse que a polícia havia encontrado dez delas na casa de Suedna Barbosa Carneiro, 41, conhecida como Mainha do Crime. Presa desde fevereiro, ela é suspeita de chefiar uma quadrilha que agenciava vários crimes em São Paulo, como os que terminaram com as mortes do delegado Josenildo Belarmino de Moura Júnior e do ciclista Vitor Medrado.
A maior parte dos registros de placas irregulares ocorreu nas zonas norte —em uma área que se estende da Marginal Tietê a Santana, Vila Medeiros e Vila Gustavo— e leste —em uma região entre Cangaíba e a Vila Cisper, segundo indicação aproximada da prefeitura. Segundo o secretário municipal de Segurança Urbana, Orlando Morando, essas regiões são corredores tradicionais de motocicletas.
Ele defende a iniciativa de Nunes pela dificuldade de fiscalização da frota na cidade. "Ao tirar o lacre das placas, algo que veio com o intuito de desburocratizar, criou-se uma facilidade muito grande para andar com placa adulterada."
"Estamos falando de 1,3 milhão de motos na cidade de São Paulo. O cara compra uma plaquinha de R$ 20 na internet, não toma multa e anda fora da velocidade. Para o crime, virou uma ferramenta perfeita."
Com a volta do lacre nas placas, a fiscalização em abordagens seria mais fácil, diz a prefeitura. De acordo com o Ministério dos Transportes, a volta do lacre nas placas de moto já vinha sendo estudada na Senatran (Secretaria Nacional de Trânsito). O tema —assim como o ofício do prefeito ao ministério— foi enviado ao TCU (Tribunal de Contas da União) e aguarda análise. Procurado, o tribunal disse, por email, não ter encontrado processo com as demandas.
Atualmente, a cidade tem 31,3 mil câmeras em operação, 4.000 delas com capacidade de leitura de placas, que fazem a checagem da informação sobre veículos roubados ou furtados com o Córtex, banco de dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O próximo passo é equipar viaturas para fazerem esse monitoramento.
Até o fim de julho, segundo Morando, serão cem motocicletas com o equipamento —metade da GCM (Guarda Civil Metropolitana), metade da Polícia Militar. A prefeitura também está planejando fazer blitze pela cidade, competência permitida, de acordo com o secretário, por um convênio assinado em maio com o Detran para que guardas possam fiscalizar veículos.
Para Rafael Alcadipani, o professor FGV (Fundação Getulio Vargas) e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a volta do lacre é positiva. "Tudo bem que existem hoje tecnologias eletrônicas, como QRCode, mas o lacre, no momento da abordagem, era favorável, sim."
Já o consultor em segurança José Vicente da Silva Filho, coronel reformado da PM paulista, lembra do lacre como uma "burocracia infernal". Ele defende mais coordenação entre programas existentes para combater os crimes relacionados a veículos. "Falta um pouco mais de sistematização para fins de fiscalização e segurança, que hoje ainda é precária. Nós temos marca, modelo e placa de veículos. Com as clonadas, começa a aparecer o problema." O ideal seria aproveitar, diz o especialista, iniciativas como Córtex e o Detecta, programa do governo de SP agora integrado ao Muralha Paulista, para enfrentar o problema.