Vídeo mostra jaguatirica e gambá, geralmente predador e presa, convivendo na Amazônia

22 hours ago 1

Roteiristas em busca do próximo Timão e Pumba, de "O Rei Leão", talvez queiram olhar para a Amazônia, onde improváveis duplas de jaguatirica e gambá foram filmadas convivendo.

Pesquisadores da Estação Biológica Cocha Cashu, no sudeste do Peru, instalaram uma armadilha fotográfica para estudar o comportamento de pássaros, mas acabaram registrando uma aparição surpresa: uma jaguatirica seguindo um gambá.

A jaguatirica, um felino um pouco maior que um gato doméstico, e o gambá-comum, um marsupial, são normalmente predador e presa. No vídeo, porém, eles se moviam juntos.

"Estávamos sem acreditar no que tínhamos visto", disse a ecologista comportamental Isabel Damas-Moreira, da Universidade de Bielefeld (Alemanha).

Talvez a jaguatirica estivesse seguindo seu futuro jantar para aprender sobre seu comportamento, embora isso não explicasse o comportamento descontraído do gambá. Então veio um segundo clipe: a mesma dupla vagando de volta pelo caminho minutos depois.

"Como dois velhos amigos voltando para casa de um bar", afirmou Damas-Moreira.

Intrigados, eles contataram pesquisadores em outras partes da Amazônia que encontraram outros três vídeos, quase idênticos, de diferentes locais e anos.

Damas-Moreira e seus colegas então montaram um experimento, que descreveram no mês passado na revista Ecosphere. Eles deixaram tiras de tecido impregnadas com cheiro de jaguatirica, cheiro de puma e um controle na frente de armadilhas fotográficas.

Os gambás visitaram o cheiro de jaguatirica 12 vezes, frequentemente ficando ali para esfregar-se contra, cheirar ou morder o tecido. O cheiro de puma atraiu só um visitante, e brevemente.

A atração dos gambás por jaguatiricas continua sendo um mistério, mas Damas-Moreira e seus colegas suspeitam que haja algo que atraia ambos os animais. Uma hipótese é a "camuflagem química".

"Os gambás têm um cheiro forte, e uma jaguatirica próxima pode ajudar a esconder o cheiro do gambá de predadores maiores, ou o odor do gambá pode mascarar a presença da jaguatirica das presas", afirmou o biólogo evolutivo e ecologista Ettore Camerlenghi, da ETH Zurich, um dos autores do estudo.

Os gambás também são resistentes ao veneno das jararacas que vivem na Amazônia. As jaguatiricas não possuem essa defesa, e a parceria poderia dar à dupla uma vantagem durante a caça, segundo Camerlenghi. Na América do Norte, existe uma aliança semelhante entre coiotes e texugos, que se unem para caçar esquilos.

A descoberta não surpreende o biólogo teórico Erol Akcay, da Universidade da Pensilvânia (Estados Unidos), que não esteve envolvido na pesquisa. "Tendemos a subestimar o quanto de cooperação existe na natureza."

Um dos exemplos favoritos de Akcay do que os cientistas chamam de mutualismo de caça é entre os pássaros indicadores de mel e os humanos. Os pássaros guiam as pessoas até ninhos de abelhas e, quando os humanos os abrem para obter mel, os indicadores se alimentam da cera de abelha.

Quanto aos gambás e jaguatiricas, o biólogo suspeita de uma troca semelhante: "Os gambás podem guiar a jaguatirica até presas que eles próprios não conseguem abater, mas podem se alimentar da carniça que as jaguatiricas deixam para trás".

O professor Diego Astúa, curador de mamíferos na Universidade Federal de Pernambuco, cujas pesquisas se concentram em gambás, chamou o estudo de incrível.

Segundo o docente, considerando que os gambás são criaturas solitárias que nem mesmo convivem com sua própria espécie fora da família ou acasalamento, o comportamento registrado nos vídeos é inesperado.

A descoberta destaca ainda algo que Astúa conhece bem: a pesquisa sobre o comportamento dos gambás ainda está em sua infância. "Provavelmente encontraremos cada vez mais registros surpreendentes como esse."

Sem armadilhas de câmeras de vídeo, a descoberta talvez nunca tivesse acontecido. Ambas as espécies são noturnas e difíceis de serem encontradas, tornando rara a observação direta em florestas tropicais densas, de acordo com Camerlenghi.

"As filmagens revelaram interações que apenas com fotos poderiam facilmente ter sido confundidas com encontros predador-presa", acrescentou Damas-Moreira.

Embora o comportamento em si continue intrigante, o fato de ter sido capturado em filme é puro acaso.

"A ciência frequentemente funciona assim", disse Camerlenghi. "Você procura por uma coisa e acaba encontrando outra, que às vezes se revela ainda mais interessante do que aquilo que você estava buscando originalmente."

Read Entire Article